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Tonye
Mahop, pesquisador do Jardim Botânico de Limbe, conta que "existem
vários registros de cura da dependência de cigarro, de mganga
(marijuana africana) e de fofo
(um álcool local concentrado, feito de vinha de palmeira) com a
iboga nos cultos do Bouiti. O problema é que os informantes não
contam bem como preparam e usam a planta, tem uma parte do
conhecimento que fica sempre em segredo".
Existem
dois tipos de Bouiti: o tradicional (que rejeita o cristianismo) e o
sincrético, o mais difundido. O primeiro é praticado pelos Mitsogho
e o segundo pelos Fang, ambos grupos Bantu. É provável que durante
o século XIX os pigmeus tenham transmitido seus conhecimentos aos
Apindji, que os teriam passado por sua vez ao Mitsogho, ambas
populações do sul do Gabão. Estes grupos elaboraram durante o
século XIX um culto dos mortos, o Bouiti tradicional. O Bouiti
sincrético ou Fang foi elaborado na época da primeira guerra
mundial. Ele é produto de influências do Bouiti tradicional; do
culto ancestral tradicional dos Fang, o Bieri
(que utilizava uma outra planta alucinógena), e da evangelização
cristã, sobretudo católica. Atualmente há nove ramas do Bouiti.
Existe um outro culto que utiliza a ioga, o Abri, até hoje
pouquíssimo estudado. Este é comandado por mulheres e se dedica ao
tratamento de doenças com ioga e outras plantas medicinais.
Abada
Mangue Clavina é presidente da Associação Bombo Ima et Bandeei
(ASSOKOBINAC) dos Camarões e líder de uma igreja Bouiti Dissumba
Mono Bata
em Yaounde, cuja base é o núcleo familiar composto por suas duas
mulheres e 10 filhos. Há prières
todos os sábados. De acordo com ele, existe um tratamento específico
para a tóxico-dependência com o uso da iboga, que dura dois ou três
dias, dependendo do paciente e da gravidade do problema. São
ministradas duas, três ou quatro colheres de café (4 a 8 g) de um
pó da casca da raiz (essa é raspada e picada). A "iboga
purifica o sangue. Temos obtido sucesso em 100% dos casos". Os
casos mais difíceis podem exigir a realização de iniciação, que
tem como custo 200.000 mil francos centro africanos (CFA) em oposição
aos 50 mil empregados no tratamento ordinário.2
A
iniciação dura três dias. Na abertura, o candidato confessa todos
os seus pecados e toma um banho ritual. Este momento clímax da vida
do bouitisita é marcado pela ingestão em jejum de uma enorme
quantidade de eboka
(pode chegar a 500g) e de ossoup,
uma espécie de chá frio feito com a raiz da planta. O grupo
acompanha o neófito durante a prière,
onde todos cantam, tocam e dançam noite a dentro.
A
iniciação tem como objetivo produzir um coma induzido - os
estudiosos ainda não conseguiram definir com precisão o tempo de
duração deste. De acordo com os praticantes, em algum momento o
espírito sai do corpo e viaja para o plano da criação, para o
"lado de lá", isto é, visita o mundo dos mortos. Pode
receber revelações, curas ou se comunicar com os seus ancestrais. A
citar,
a "harpa sagrada", orienta a viagem e traz o espírito de
volta para o corpo. Terminada a cerimônia, o sujeito, renascido com
uma nova identidade - Bandzi,
'aquele que comeu' - deve relatar detalhadamente as suas visões e
experiências. A diferença do ritual Bouiti com outros rituais de
passagem tradicionalmente estudados pelos antropólogos, é que neste
caso, a morte é quase real (e não metafórica ou simbólica), pois
explora-se o limite concreto entre vida e morte.
A
curandeira Nanga Nga Owono Justine, iniciada há 25 anos na rama
Dissumba
do Bouiti, explica: "A Eboka
é uma ciência que corrige. Ela é como uma porta que se abre
somente quando uma pessoa morre. Os negros tiveram a fortuna através
da Eboka
de visitar o lugar para onde iremos quando morreremos, só que antes
de morrer - é uma ocasião de se transformar." Sua mãe, a
anciã Bilbang Nga Owono Christine, acrescenta: "para se curar
você tem que estar convencido, é você mesmo que se cura. Precisa
da intenção, da eboka
e da fé em Deus, que é o maestro de tudo". Lembrando a sua
própria iniciação, época em que tinha uma "doença nos
olhos", contou que "uma estrela me guiou até um hospital
no lado de lá, onde eu fui operada dos olhos. Vi o meu espírito
saindo do meu corpo e os médicos me operando. Voltei curada".
Podem
ocorrer morte nos rituais de iniciação do Bouiti. Segundo Calvin,
isto pode acontecer devido a diversos fatores. Um deles é a
incompetência ou falta de capacidade do guerriseur.
Outro é que a eboka
não pode ser administrada para um doente que esteja demasiado
debilitado fisicamente. Finalmente, "se doente que faz a
iniciação é um bruxo, durante viagem astral o seu espírito quer
para ir para a zona da obscuridade. Ele pode se perder e no caminho e
não conseguir voltar, causando a morte do corpo físico". Os
Fang conhecem um antídoto, uma folha que anula o efeito da eboka,
a qual chamam Ebebing.
Fonte:Viagem ao encontro da Iboga (Bia Labate)
* Bouti é a grafia em francês; em inglês é Bwiti e em português seria Buiti. Resolvi manter no original por via das dúvidas.
* Em fevereiro de 2001, 1 U$ dólar eqüivalia a 720 CFA.
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